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Investigadores transformam ondas de rádio em energia

Projeto da Universidade de Aveiro permite telecomando funcionar sem pilhas

Em Portugal os telespetadores gastam anualmente cerca de 3 a 4 milhões de pilhas para mudarem de canal sentados no sofá. O cenário está prestes a mudar pois Alírio Boaventura, investigador do Instituto de Telecomunicações (IT) da Universidade de Aveiro (UA), desenvolveu um comando de televisão que não precisa de pilhas ou baterias para funcionar.

Apesar de o telecomando protótipo estar a ser testado num televisor, pode ser aplicado a aparelhagens de som, de leitores de DVD, de boxes de televisão ou até mesmo d

e equipamentos de ar-condicionado e de portas de garagens, permitindo funcionar eternamente sem necessitar de pilhas.

É constituído apenas por uma placa de circuitos e, para já, por quatro botões que permitem mudar de canal e regular o volume. O segredo do telecomando antipilhas está na antena conversora de energia. Esta tem a capacidade de converter em energia elétrica DC as ondas de rádio emitidas por um leitor RFID previamente instalado no televisor. A energia DC captada é usada para alimentar a eletrónica do telecomando. Para comunicar com o televisor o telecomando modula e reflete parte da energia rádio recebida. Nesta fase entra novamente o leitor RFID que descodifica a informação recebida do comando, que poderá ser, por exemplo, um pedido de mudança de canal ou ajuste do volume.

“Um modelo possível de exploração desta tecnologia passa por, futuramente, incorporar o sistema rádio (RFID) em dispositivos como televisores. Alternativamente e de forma a garantir compatibilidade com os equipamentos já instalados, um adaptador de radiofrequência para infravermelhos poderá ser usado”, refere Alírio Boaventura.

O comando é uma das faces mais visíveis do trabalho que os investigadores têm desenvolvido nos últimos anos na área da captação e conversão de radiofrequências em eletricidade. Em testes laboratoriais, o IT tem ainda uma antena que não se limita a recolher sinais de rádio: reconverte-os em energia elétrica que pode ser usada imediatamente ou armazenada para uso posterior.

A antena, que na aparência não é muito diferente das que são normalmente utilizadas para captar sinais de TV, quando colocada nas proximidades de um retransmissor de rádio, consegue converter o sinal eletromagnético numa corrente eléctrica contínua capaz de ligar duas lâmpadas LED. E quanto maior potência tiver o retransmissor, maior potência elétrica pode ser alcançada.

Junto à fonte de transmissão que os investigadores têm utilizado para testar o protótipo o circuito desenvolvido produz uma tensão elétrica de aproximadamente 10 volts. A 1,5 quilómetros de distância da antena retransmissora, o protótipo alcança os 3 volts.

Os resultados são promissores: “Se fosse junto da antena de TV do Monte da Virgem, em Gaia, daria para ligar bem mais do que dois LEDs”, garante Nuno Borges Carvalho, investigador do IT e um dos responsáveis pelos avanços que a UA tem feito no estudo de um filão energético que paira no ar à espera de ser aproveitado.

“Este princípio pode ser aplicado a qualquer tipo de emissão eletromagnética, quer seja rádio FM, TV, Wi-Fi ou GSM, o que permite que, no futuro, se possa vir a carregar a bateria de dispositivos móveis sem estar dependente de uma única frequência”, aponta Nuno Borges Carvalho. “Todos os sinais de rádio frequência que estão no ar podem mesmo ser colhidos e transformados em energia elétrica”, sublinha o responsável.

“Atualmente a grande proliferação de sistemas rádio deu origem a uma nova forma de energia alternativa que pode ser reciclada e reaproveitada em sistemas de baixo consumo”, acrescenta Alírio Boaventura.

Se hoje a energia reconvertida a partir das ondas de rádio não chega para fazer funcionar dispositivos com elevada exigência energética como por exemplo um computador, num futuro mais próximo o IT quer que esta possa alimentar sensores de baixa potência com consumos reduzidos ou esporádicos.

“Com esta tecnologia vai ser possível, por exemplo, criar chaves de carros que estão sempre a coletar energia das comunicações rádio e que só a gastam quando são usadas. O conceito também pode ser útil para criar sensores ambientais, alarmes, lanternas ou até mesmo fornecer energia ‘gratuita’ à iluminação pública situada num raio à volta do retransmissor da estação de rádio”, antevê Nuno Borges Carvalho. “Em qualquer destes casos temos a vantagem de dispensar o uso de pilhas ou de energia elétrica da rede pública”, diz o investigador.

In: www.cienciahoje.pt